50 ANOS APÓS O D-L 44104 - 5º PARTE
A fábrica da General Motors na Azambuja (IV)
Em 1990 foi implementado o projecto Combo, um pequeno comercial baseado no Opel Corsa, que teve tanto de bom como de mau para a GM da Azambuja. Com o Combo a fábrica alargou a sua expansão a nível mundial e ampliou ainda mais as suas instalações mas, foi também devido ao Combo que acabou por fechar as portas.
Em 1983 foram feitos novos investimentos de vulto para responder às necessidades de produção, associadas ao fabrico exclusivo na Europa de viaturas comerciais da GM, para todos os mercados do undo, com base na segunda geração do Opel Corsa. Estes novos investimentos, que implicaram a robotização de mutas operações na área das carroçarias e da pintura que viram, mais uma vez, a sua capacidade e dimensões aumentadas, permitiram um incremento da produção para as 15 por hora.
A capacidade anual da fábrica era então de 54 mil viaturas em dois turnos e a área coberta representava já mais de 40 mil metros quadrados do total de 190 mil metros quadrados.
Durante o ano de 1995 a produção da GM da Azambuja ultrapassou o meio milhão de unidades e o futuro mostrava-se promissor.
Entre 1999 e 2001 a General Motors investiu na Azambuja 130 milhões de euros, dando continuidade ao processo de modernização e actualização constante da fábrica, com o objectivo de manter e melhorar a produção do Combo. Triplicou o número de robots de soldadura, instalaram-se novos transportadores, modernizou-se a linha de montagem e instalou-se uma nova pintura, preparada para trabalhar com produtos de base aquosa, o que fez com que a fábrica da Azambuja fosse a primeira da Europa, pertencente à GM, com uma linha da pintura deste tipo para aplicação de pinturas metalizadas e com capacidade de aplicação total de PVC para isolamento da parte inferior das carroçarias.
Mas, os investimentos não ficavam por aqui e, entre 2002 e 2003, investiram-se mais 2,7 milhões de euros, na melhoria dos processos de fabrico, que permitiram continuar a aumentar a capacidade de produção.
Como membro pleno da rede de produção da General Motors, a fábrica da Azambuja adoptou o sistema de produção Global Manufacturing System (GMS) e tornou-se na unidade mais produtiva da GM, logo a seguir à fábrica da Opel de Eisenach, na Alemanha. Em simultâneo, tinha os custos de produção mais baixos relativos à mão de obra, apenas ultrapassada pela fábrica polaca de Gliwice.
Em Setembro de 2004, trabalhavam na GM da Azambuja cerca de 1200 funcionários e fabricava-se apenas o comercial Combo Van e Combo Tour, sob as marcas Opel, Vauxhall, Holden ou Chevrolet, em função dos mercados a que se destinavam. Receberam nessa altura um motor Diesel de 1300cc com 70 CV, que os tornavam mais competitivos no mercado europeu, partilhado por outras ofertas, como as dos franceses Peugeot/Citroên Partner/Berlingo, Renault Kangoo e os espaçosos italianos Fiat Dóblo, que também tinha este motor.
No final de 2005, um relatório da GM destacava o desempenho da fábrica da Azambuja, que registava um aumento de produção de 11,2% face a 2004, ao montar 73.711 veículos. Ao nível da qualidade, “a fábrica da Azambuja voltou a apresentar excelentes indicadores e a evidenciar uma elevada eficiência a nível do processo produtivo, cotando-se entre as três melhores unidades industriais da GM Europa”, como estava mencionado no relatório.
Cinco meses mais tarde dá-se uma reviravolta inacreditável, ao ser publicado um estudo que evidenciava que, o custo de produção por veículo apresentava uma desvantagem de 500 euros, comparativamente a Saragoça.
A General Motors utilizou este estudo para justificar o encerramento da fábrica, afirmando que a desvantagem se devia aos elevados custos logísticos. Mas esta desculpa é muito difícil de justificar a quem entende minimamente como funciona a indústria automóvel e como se faz a gestão dos custos dos projectos. A verdadeira razão só os dirigentes da GM conhecem, no entanto parece-nos mais lógico que este encerramento se tenha devido a razões de realinhamento estratégico da GM, a nível Europeu e de expansão a nível mundial, do que a razões de logística, ultrapassáveis com algum investimento recuperável a prazo.
O encerramento da GM da Azambuja teve, além do dramatismo associado a situações deste tipo, um grande efeito de surpresa e muita demagogia política, associada a pouca capacidade de lidar com a situação. Os sindicatos também não tiveram bom senso e a sua visão, demasiado agarrada ao passado, com greves que em nada ajudavam para melhorar as relações e a situação, movidas por interesses partidários, não contribuíram para evitar o encerramento, antes pelo contrário.
O então ministro da economia, Manuel Pinho, proferiu algumas palavras que, além de não tranquilizar os funcionários, pouco ou nada fizeram para mudar o rumo das coisas. Segundo o Ministro o encerramento não se deveu a “quebras de produtividade dos trabalhadores, mas sim a problemas internos da empresa”. Problemas esses, segundo a nossa opinião, muito mal explicados e que, aparentemente, não justificavam este encerramento, muito menos após os avultados investimentos que tinham sido feitos na fábrica, tornando-a na mais mais moderna do nosso país, logo a seguir à Volkswagen Autoeuropa.
O Governo português podia exigir o reembolso dos subsídios e incentivos dados à fábrica, no valor de 30 milhões de euros, e que era na altura um factor que jogava a favor dos trabalhadores. O ministro da Economia disse que “o caso General Motors tem de ser um caso exemplar”, sugerindo que Governo tencionava exigir uma indemnização à empresa pelo encerramento da fábrica na Azambuja. Hoje não se sabe se esse reembolso foi exigido e muito menos se deu entrada nos cofres do Estado.
Não podemos esquecer que directa e indirectamente, a fábrica dava trabalho a mais de 1.700 trabalhadores, produzindo cerca de 70 mil veículos por ano para o mercado externo, o que correspondia a cerca de 0,6% do nosso PIB, já que poucos ficavam no nosso país.
Apesar do desalento e da decepção dada pela GM, os trabalhadores cumpriram o acordo que assinaram com a empresa no início de Outubro de 2006, no qual, em troca de um plano de compensações, se comprometeram a fabricar 23.062 veículos até ao final da produção. Por dia, no período antes do encerramento, saiam da fábrica 320 veículos.
Nem a solidariedade demonstrada pelos trabalhadores das outras 18 fábricas, que a GM detinha na Europa, teve qualquer impacto no sentido de evitar o encerramento da unidade da Azambuja. Foram para o fundo de desemprego mais de 1.100 trabalhadores, os que restavam, e um ano após o encerramento da fábrica, mais de metade ainda não tinha conseguido emprego.
A linha de montagem foi desmantelada e todas as ferramentas transferidas para a fábrica da GM de Saragoça.
Em Junho de 2007, a General Motors Portugal e a Turiprojecto Investimentos Imobiliários assinaram o contrato de compra e venda dos terrenos e das instalações da fábrica, para a construção de um parque eco-industrial que deveria dar emprego a 1.380 pessoas.
Talvez tenha sido uma ironia do destino, o facto de actualmente existir naquela região um dos maiores centros logísticos do nosso país, o local onde existiu uma fábrica que se desculpou com a logística para fechar as portas.
Foi com muita dor, emoção e alguma revolta, não só para os que lá trabalharam, mas também, para todos os portugueses, que assistimos ao encerramento da fábrica da General Motors na Azambuja. Ainda hoje quando se passa perto das instalações, é difícil de acreditar que mais de 33 anos de produção, com muitas vidas dedicadas ao projecto, após tantas conquistas e realizações, tudo se dissolveu...
Agradecemos o apoio e a documentação disponibilizada pelo Sr. Justino Santos para a elaboração deste trabalho. Na próxima edição, inserido na comemoração dos 50 anos do Decreto-lei 44104, vamos começar a abordar a fábrica da Ford da Azambuja, a mais moderna fábrica de automóveis em Portugal na década de 60 do século passado. Continuamos a solicitar a vossa colaboração e apoio no sentido de nos fazerem chegar, depoimentos, digitalizações ou cópias de artigos, documentos, fotos, imagens, folhetos ou revistas que nos possam auxiliar na realização deste trabalho, sobre todas as fábricas portuguesas de automóveis. Desde já o nosso agradecimento pela ajuda que nos poderão prestar.